VIAJAR NO TEMPO É MOLEZA. Difícil é não viajar no tempo. Note que, enquanto lê esta frase, você está viajando no tempo - mais ou menos dois segundos na direção do futuro, para ser exato.
Ah, aí não vale? Vale sim. Porque, desde que Albert Einstein desenvolveu sua Teoria da Relatividade, sabemos que o tempo não é o pano de fundo sobre o qual se desenrolam os eventos do Universo. Em vez disso, ele é uma dimensão, parecida em essência com as tradicionais profundidade, altura e largura que todos conhecemos no dia-a-dia.
Da mesma forma que podemos andar para um lado ou para o outro em uma dimensão espacial, também é possível "caminhar" pelo tempo. Ocorre que, diferentemente do que se verifica nas outras dimensões, no tempo não podemos escolher em que direção avançar. Parece que estamos presos nesse fluxo, inexoravelmente arrastados rumo ao futuro, num ritmo definido e constante.
Mas será?
A própria teoria de Einstein sugere que há maneiras de manipular esse arrasto e fazer, na prática, o que chamaríamos de viagens não convencionais pelo tempo - ou seja, indo de um ponto a outro sem necessariamente ter de passar por todos os pontos entre eles, que é o que nos interessa aqui.
Viajar para o futuro é, na verdade, bem simples. Basta acelerar no espaço para, tchã-rãn!, ace-lerar no tempo. A relatividade demonstra que, ao corrermos em grande velocidade, algumas coisas estranhas acontecem conosco. Nós basicamente "afinamos" no sentido do movimento, ficamos mais pesados e, o mais importante para a discussão desta reportagem, o tempo passa mais devagar para nós, de forma muito sutil, mas real.
Sim, acredite se quiser, mas o tempo passa mais devagar para o Rubinho Barrichello na pista do que para os espectadores na arquibancada (pensando bem, isso talvez explique muita coisa). Só que a diferença, nesse caso, é pentelhesimalmente pequena. Na prática, a diferença é inexistente.Ocorre que, ao viajarmos em ritmos que começam a se comparar à velocidade da luz, essa discrepância começa a se tornar mais notável, dando origem a um exemplo clássico da viagem para o futuro, conhecido como paradoxo dos gêmeos.
Imagine dois jovens gêmeos idênticos. Um deles é recrutado para ser astronauta e fazer um voo experimental em uma nave da Nasa capaz de atingir 50% da velocidade da luz. Ele parte, vai até Alfa Centauri (a estrela mais próxima do sistema solar, a poucos anos-luz daqui) e volta, numa viagem de 16 anos. Quando retorna, a surpresa: seu irmão gêmeo já é um idoso, à beira da morte, enquanto ele envelheceu apenas o tempo da viagem.
O que aconteceu foi que, enquanto o tempo passava mais devagar para o irmão astronauta, o que ficou na Terra envelhecia no ritmo normal. Daí a discrepância impressionante entre os gêmeos, que pode ser vista, grosso modo, como uma viagem do irmão astronauta rumo ao futuro!
Claro, acelerar uma espaçonave a 50% da velocidade da luz ainda não está ao alcance da Nasa - pelo menos com o orçamento atual da agência espacial americana -, mas não há nada que impeça isso de acontecer. A física dita que a velocidade máxima possível no Universo é a da luz (cerca de 300 mil km/s), mas nada versa sobre tudo o que for abaixo disso. Entretanto, a situação se complica muito mais quando falamos de viajar rumo ao passado. Aí a coisa beira mesmo a impossibilidade.
Onde a porca torce o rabo
Há muitos argumentos, de física pesada, que su-gerem a inviabilidade de voltar ao passado. Podemos citar, só para começo de conversa, que uma viagem assim violaria as leis de conservação de matéria e energia e que provavelmente exigiria a realização de uma travessia mais rápida que a luz para acontecer.
Entretanto, os cientistas já encontraram, usando a própria Teoria da Relatividade, meios de driblar essas dificuldades e imaginar máquinas do tempo que, pelo menos em princípio, funcionariam.
O principal fenômeno candidato a dar origem a uma máquina do tempo é o buraco de minhoca. Primo exótico do conhecido buraco negro, um buraco de minhoca seria uma espécie de fenda espacial que ligasse dois pontos distantes e descontínuos do espaço-tempo. Caso algo assim pudesse existir, ele conectaria instantaneamente dois lugares potencialmente muito distantes do Universo.
Ocorre que, pela Teoria da Relatividade, não é só a velocidade que altera o ritmo da passagem do tempo. A presença de matéria e energia também modifica como o tempo passa. Na prática, estar num avião a 10 km de altitude faz com que o tempo passe mais rápido do que estar no chão - colado à massa da Terra. Ou, em termos ainda mais corriqueiros, se você dormir agarrado ao despertador, a massa agregada poderá permitir que você acorde um tiquinho mais tarde para ir trabalhar.
Ritmos diferentes
Ora, se um buraco de minhoca conectar dois pontos com distribuição diferente de massa, o tempo passará em ritmos diferentes nas duas pontas. Portanto, o que era apenas um atalho pelo espaço se torna também um atalho pelo tempo!
Tudo resolvido então? Quase. O único (grande) problema é que, para um buraco de minhoca exis-tir, ele precisa de algo que os físicos chamam de matéria exótica - substância que teria densidade de energia negativa. Desnecessário dizer que os cientistas nunca viram algo parecido, até agora. O que talvez sugere que a natureza "prefira" que essas viagens ao passado nunca ocorram. E por um bom motivo: elas podem gerar paradoxos insolúveis.
A melhor coisa para poder entender esse pedaço é assistir ao clássico filme de Robert Zemeckis, De Volta para o Futuro. Nele, Marty McFly (Michael J. Fox) volta ao passado e quase impede seus pais de se apaixonarem, o que geraria sua inexistência. Mas, se Marty deixasse de existir, não teria como voltar no tempo, e aí seus pais se apaixonariam, e com isso ele voltaria a existir, para voltar no tempo e... você entendeu o tamanho do problema.
No filme, Marty consegue desatar o nó e impedir o paradoxo. Mas os cientistas preferem não correr riscos e imaginar que alguma lei da natureza deva barrar episódios como esse, que eliminariam a clara relação entre causa e efeito existente no Universo. Sintetizando esse pensamento, o famoso físico britânico Stephen Hawking criou o que ele chama de Conjectura de Proteção Cronológica, uma suposta lei física que impediria absurdos como o paradoxo enfrentado por Marty McFly.
Para o físico neozelandês Matt Visser, ela faz todo o sentido. Visser estuda a possibilidade da existência de buracos de minhoca e descobriu que uma quantidade bem pequena de matéria exótica já poderia manter uma dessas passagens abertas. O resultado traz uma perspectiva otimista: em se tratando de uma substância que ninguém nunca viu, quanto menos você precisar, melhor. Mesmo assim, ele não acredita realmente que seja possível viajar rumo ao passado. "Eu sou totalmente a favor da Conjectura de Proteção Cronológica e defendo que seja elevada a um Princípio de Proteção Cronológica", afirma o pesquisador.
Fim da história, então? Talvez não. Gostem ou não os físicos, há coisas muito estranhas acontecendo na natureza que nos fazem pensar a respeito do tema. Sabemos que, para cada partícula - seja um próton, um nêutron, um elétron, seja qualquer outra -, existe uma antipartícula equivalente: antipróton, antinêutron, pósitron, e assim por diante.
O físico americano Richard Feynman, um dos mais brilhantes do século passado, desenvolveu uma série de diagramas para interpretar a ação dessas partículas e antipartículas e fez uma cons-tatação intrigante: as antipartículas se comportam exatamente como se fossem partículas, só que viajando no sentido contrário do tempo - como se estivessem caminhando do futuro para o passado.
Será que elas realmente estão fazendo isso? Ou é apenas um efeito bizarro da física quântica? As perguntas seguem sem resposta definitiva da parte da ciência. Mas é claro que, mesmo que partículas possam viajar para trás no tempo (assim como podem aparecer e desaparecer do nada), isso não quer dizer que Marty McFly ou seu amigo inventor, o Dr. Emmett Brown, possam...
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