Sustentabilidade
Avatar e as fábulas do século XXI
Os alienígenas azuis são um exemplo de protagonistas das lendas modernas.
Quem não assistiu a
Avatar, nem precisa ler uma introdução explicando do que se trata: o filme dispensa apresentações. Quem já assistiu, sabe que a produção de James Cameron é de encher os olhos graças às imagens coloridas e produzidas com moderna tecnologia cinematográfica. Mas não é por causa da qualidade técnica que estamos falando de Avatar, e sim devido à maneira original como esta produção transmite
uma mensagem de fundo ambiental.
(Não vou contar o final, mas tome cuidado se você ainda não assistiu ao filme: este texto contém alguns spoilers – revelações sobre o roteiro.)No enredo,
Jake Sully (interpretado por Sam Worthington) é um
soldado paralítico que viaja para o planeta
Pandora, onde recebe a missão de
se infiltrar entre os nativos, chamados de
Na’vi, e convencê-los a permitir que os terráqueos
explorem suas reservas naturais. Na equipe de humanos, estão a
Dra. Grace Augustine (Sigourney Weaver) e o
Coronel Miles Quaritch (Stephen Lang), responsável pela missão, que não hesitará em utilizar força militar, se necessário, para alcançar seu objetivo. Ao se misturar com os Na’vi, Jake conhece
Neytiri (Joe Saldana), que vai ajudá-lo a compreender um dos princípios mais fundamentais para seu povo: o de que
tudo na natureza está interligado. Sua divindade – chamada
Eywa – pode ser considerada a própria natureza.
O povo Na’vi lembra um pouco os povos indígenas do Brasil, não por viver sem roupas, mas por
desenvolver sua sociedade de forma a obter da natureza o necessário para manter suas vidas, sem esgotá-la. Em outras palavras, a grande lição de Avatar não é simplesmente “vamos viver pelados no meio da selva”.
O filme nos avisa que estamos tirando da natureza mais do que ela pode suportar, e o que é pior: para fins que talvez não sejam tão necessários. (Na trama, Neytiri diz a Jake que os Na’vi não precisam de certas coisas às quais dão os humanos tanto valor.)
Pode haver críticas à postura defendida pelo filme de dar mais valor ao espiritual/ambiental do que ao econômico, mas, na verdade, Avatar mostra que
a economia pode ser equilibrada com a ecologia (saiba mais), e que uma pode até ajudar a outra. Sem entrar no mérito dos aspectos éticos e científicos que justificam a preservação da natureza, eis um exemplo que podemos tirar do próprio filme.
A árvore versus os seres humanos: quem vai levar a melhor?
O principal objetivo dos humanos em Pandora é explorar um reservatório de
unobtanium, um precioso minério. Para isso, seria necessário
derrubar uma árvore gigante (sagrada para os Na’vi) localizada bem acima do reservatório. Entretanto, a Dra. Grace alerta o Coronel Quaritch para o fato de que
a árvore era uma maravilha da biologia, por possuir terminações nervosas parecidas com neurônios, que poderiam
armazenar mais informações que o próprio cérebro humano.
Ora,
armazenamento de informações é justamente um ponto crucial para o desenvolvimento da informática. Quantos investimentos não são feitos todos os anos em pesquisas para desenvolver chips cada vez menores e mais poderosos? Portanto, será que
tomar a decisão de manter a árvore em pé, investigar suas
capacidades especiais e assim
aprimorar a tecnologia humana não seria mais
inteligente, tanto do ponto vista
ambiental quanto do
econômico?
Outro aspecto ambiental é abordado no momento em que Jake pede para Eywa proteger os Na’vi dos humanos, ao que Neytiri o adverte:
“A natureza não toma partido. Ela só garante o equilíbrio da vida”. Com esta frase, percebemos que
os habitantes de um planeta não são mais poderosos do que o próprio planeta, e que as espécies que contribuem para a manutenção da vida, e não para sua destruição, serão preservadas, pela lógica da natureza. Esse tema já foi discutido aqui no Blog há algum tempo:
Na verdade, mesmo que o homem destruísse a superfície terrestre, a evolução faria com que novas espécies surgissem e novos ecossistemas se desenvolvessem. Não voltaríamos ao estado inicial, mas a natureza continuaria seu caminho. Sem a humanidade. (...) Portanto, “salvar o planeta” não é uma expressão muito adequada, pois implica uma relação inexistente de dominação do homem sobre a Terra. (...) Por isso, até certo ponto, a luta pela preservação da natureza é uma luta pela preservação da humanidade. Somos apenas inquilinos do mundo!
Máquinas militares cortando os ares de Pandora: uma luta perdida?
Voltemos agora ao título deste post. O que são, afinal, as “fábulas do século XXI”?
O fato é que
Avatar não é a primeira história a utilizar a fantasia embutida com lições de moral para transmitir uma mensagem ecológica (ingredientes perfeitos para os sucessores modernos dos contos de fadas). Outro filme já fizera isso em 2009 e, como Avatar, lançou mão de computação gráfica, criatividade e uma qualidade cinematográfica que lhe rendeu o Oscar de Melhor Filme de Animação:
Wall-E, da Disney/Pixar. Neste filme,
a Terra é abandonada pelos humanos, depois de tornar-se inabitável por causa da poluição. Mas a esperança pôde ser renovada quando, séculos depois,
a vida ressurge com o nascimento de uma pequena plantinha.
O que torna o filme da Disney diferente de Avatar é que, neste último,
o público é estimulado a mudar de atitude não só pela
dor que sente ao testemunhar a destruição de um habitat preservado, como também pelo
prazer proporcionado ao
Ver belas cenas que ilustram o ambiente natural preservado. E o verbo “Ver” aqui tem duas conotações: pode ter o significado tanto de
enxergar, no aspecto meramente visual, quanto de
sentir a profunda conexão na qual todos os seres vivos – inclusive nós – estão mergulhados. Não é à toa que os Na’vi não se cumprimentam com “oi” ou “tudo bem?”, mas sim dizendo:
“Eu Vejo você”.
Que Avatar divirta e entretenha seus espectadores, mas que ajude-os também a refletir um pouco sobre seu próprio comportamento. Tomara que a seguinte fala de Jake seja um alerta, e não uma profecia:
“Lá de onde eu venho, mataram a nossa mãe. E agora, querem matar Eywa”.Fotos: IMDb
loading...
-
Até Cameron, De 'avatar', Participa De Ato Contra A Usina De Belo Monte, Pa
A luta de organizações populares e indígenas contra a construção da Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA) ganhou ontem mais manifestações públicas de um aliado de peso internacional. James Cameron, o diretor canadense de Avatar, a maior...
-
Retrospectiva Verde 2010: Dez Fatos Que Marcaram O Meio Ambiente
2010 foi um ano em que a ecologia marcou a política. No Congresso, propostas ambientais foram aplaudidas, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos, e vaiadas, como o Novo Código Florestal. Nos EUA, Obama teve de enfrentar o seu maior desafio...
-
"belo Monte, Anúncio De Uma Guerra" - O Filme
Sobre o crime contra a Amazónia e seus povos indígenas chamado Belo Monte, a mega barragem no Rio Xingu, já aqui falei algumas vezes. As obras já começaram, e não adiantaram manifestações, petições, famosos pedindo, nem adiantou James Cameron...
-
Avatar E A Síndrome Do Invasor
Postado em 02/03/2010 por Marina Silva Aviso: O texto a seguir menciona partes da história do filme Avatar de James Cameron e, por isso, pode tirar a surpresa de quem ainda não o assistiu. Teve um momento, vendo Avatar, que me peguei levando a mão...
-
Dead Can Dance- Avatar
Esta palavra Avatar tornou-se popular entre os meios de comunicação e informática devido às figuras que são criadas à imagem e semelhança do usuário, permitindo sua "personalização" no interior das máquinas e telas de computador. Tal criação...
Sustentabilidade