Rio+20 - O preço da natureza ou o preço da economia verde
Sustentabilidade

Rio+20 - O preço da natureza ou o preço da economia verde


Com o tema "Economia verde", uma das questões centrais da Cimeira Rio+20, que começa amanhã no Rio de Janeiro, é a colocação de um preço nos recursos, bens e serviços ambientais, assim como já estão a fazer com as taxas de carbono. Esta ideia pode até ter tido origem e defensores bem intencionados para proteger os recursos naturais, mas o perigo que ela representa numa civilização dominada pelo capitalismo predatório é assustador. Não, não apoio, não acredito neste caminho do qual apenas adivinho que leve à aceleração das injustiças sociais e da predação dos recursos naturais. Chegaremos ao ponto de pagar uma taxa pelo oxigénio que respiramos a corporações que compraram a Amazónia?   Sobre esta questão, aconselho a leitura da Carta de Evo Morales, presidente da Bolívia, aos povos indígenas do mundo, publicada em Outubro de 2010, antes da Cimeira de Cancun.


A seguir, a tradução do texto de Esther Vivas publicado no Público.es anteontem e no blogue da autora ontem:

«Quando a economia e o capitalismo se pintam de verde

Imagem obtida aqui
O verde vende. Desde a revolução verde , passando pela tecnologia verde, o crescimento verde até chegar aos "brotos verdes" que tinham de arrancar da crise. A última novidade: a economia verde. Uma economia que, ao contrário do que o próprio nome indica, não tem nada de "verde" para além dos dólares que esperam ganhar com ela aqueles que a promovem.


E a nova ofensiva do capitalismo global por privatizar e comercializar maciçamente os bens comuns, tem na economia verde o seu expoente máximo. Justamente num contexto de crise económica como a atual, uma das estratégias do capital para recuperar a taxa de lucro consiste em privatizar ecossistemas e converter “a vida” em mercadoria.


A economia verde será precisamente tema central da agenda da próxima Cimeira das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20, a ser realizada de 20 a 22 de Junho no Rio de Janeiro, vinte anos depois da Cimeira da Terra da ONU que em 1992 teve lugar na mesma cidade. E duas décadas depois, onde estamos? Onde ficaram conceitos como "desenvolvimento sustentável" cunhados na dita cimeira? Ou a ratificação da Convenção sobre Mudanças do Climáticas, que estabeleceu as bases do Protocolo de Quioto? Ou a Convenção sobre Diversidade Biológica, que foi então lançada? No papel, nem mais nem menos. Hoje estamos muito pior do que antes.


Durante estes anos, não só não se conseguiu travar as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade, parar a desflorestação ... senão, pelo contrário, esses processos se agudizaram e intensificado. Assistimos, pois, a uma crise ecológica sem precedentes que ameaça o futuro da espécie e da vida no planeta, e tem um papel central na crise de civilização que enfrentamos.


Uma crise ambiental que demonstra a incapacidade do capitalismo para nos tirar da "beco sem saída" a que a lógica do crescimento ilimitado, o benefício a curto prazo, o consumismo compulsivo ... nos conduziu. E esta incapacidade de dar uma "saída" real, vimo-la claramente após as falhadas cimeiras do clima em Copenhague (2009), Cancun (2010), Durban (2011) ou na cimeira sobre a biodiversidade em Nagoya (Japão 2010), etc., onde acabaram por se colocar os interesses políticos e econômicos à frente das necessidades coletivas dos povos e do futuro do planeta.


Nestas cimeiras surgiram falsas soluções para as mudanças climáticas, soluções tecnológicas, desde a energia nuclear, passando pelos biocombustíveis até à captura e armazenamento de CO2 no subsolo, entre outras. Medidas que tentam esconder as causas estruturais que conduziram à atual crise ecológica, pretendendo de fazer negócios com ela, e que mais não farão que agravá-la.


Os laços estreitos entre aqueles que detêm o poder político e o poder económico explicam esta falta de vontade para dar uma resposta eficaz. As políticas não são neutras. Um solução real implicaria uma mudança radical no atual modelo de produção, distribuição e consumo, enfrentar a lógica produtivista do capital. Tocar no núcleo duro do sistema capitalista. E aqueles que detêm o poder político e económico não estão dispostos a isso, a acabar com a sua "galinha dos ovos de ouro."


Agora, vinte anos depois, querem-nos "vender a moto" da economia verde como a solução para a crise económica e ecológica. Outra grande mentira. A economia verde procurar apenas fazer negócios com a natureza e com a vida. Esta é a neocolonização dos recursos naturais, aqueles que ainda não foram privatizadas, e pretende transformá-los em mercadorias para compra e venda.


Os seus promotores são precisamente aqueles que levaram à situação de crise em que estamos: grandes empresas multinacionais, com o apoio ativo dos governos e instituições internacionais. As empresas que monopolizam o mercado de energia (Exxon, BP, Chevron, Shell, Total), da agroindustria (Unilever, Cargill, DuPont, Monsanto, Procter & Gamble), das farmacêuticos (Roche, Merck), da química (Dow , DuPont, BASF) são os principais impulsionadores da economia verde.


Assistimos a um novo ataque aos bens comuns, donde quem saímos a perder somos os 99% e o nosso planeta. E especialmente as comunidades indígenas e camponesas do Sul global, cuidadoras desses ecossistemas, que serão expropriadas e expulsas dos seus territórios para o benefício das empresas multinacionais que procuram negociar esses ecossistemas.


Com a cimeira Rio +20 pretende-se criar o que poderíamos chamar de "uma nova governança ambiental internacional" para consolide a mercantilização da natureza e que permita um maior controle oligopolista dos recursos naturais. Em suma, abrindo caminho para que as corporações internacionais se apropriem dos recursos naturais, legitimando práticas de roubo e usurpação. A resposta está em nossas mãos, dizer "não" e expor o capitalismo como uma economia que se tinge de verde

Fontes: Esther Vivas | Público, 17/06/2012






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