Eleições com sustentabilidade
Sustentabilidade

Eleições com sustentabilidade








É preciso debater, além do desmatamento, o que se tem feito em relação às florestas plantadas no país

ANALISTAS POLÍTICOS experientes vêm apontando uma obviedade absoluta em relação ao segundo turno das eleições: graças à espetacular escalada da senadora Marina Silva nos últimos dias da campanha para o primeiro turno, o tema "meio ambiente" ganhou uma dimensão muito significativa, devendo ocupar grande espaço nas plataformas dos dois candidatos à Presidência da República.
É bem verdade, como também apontam os especialistas, que a votação da senadora deveu-se mais a ela mesma do que ao tema em si, uma vez que candidatos destacados de seu partido fracassaram nas eleições para o governo de diversos Estados. Marina teve um discurso à frente do tempo dos concorrentes.
Mas a questão da sustentabilidade é hoje uma unanimidade universal: não há um terráqueo que não se preocupe com o aquecimento global, com a preservação dos recursos naturais, especialmente a água. Este ótimo discurso atraiu a juventude idealista e a enorme parcela de eleitores insatisfeitos com a performance dos demais candidatos.
Portanto, a senadora terá papel preponderante na campanha, e a temática ambiental também, sobretudo pelo amplo debate que se estabelecerá. É um importante avanço para a sociedade brasileira e nos colocará na vanguarda global quanto ao assunto, mormente quando o mundo se prepara para a retomada das conversas frustradas da COP-15.
E, com certeza, dois aspectos serão destacados no cenário nacional: o desmatamento da Amazônia e o papel da agropecuária no desenvolvimento do Brasil.
A própria revisão do Código Florestal em andamento no Congresso Nacional será, de alguma forma, permeada pelo novo patamar do tema ambiental, que, escoimado de radicalismo, ideologias ou paixões, possibilitará a construção de um projeto de desenvolvimento sustentável para o país, exatamente a partir de políticas que qualifiquem o agronegócio.
Além da redução do desmatamento, é preciso ver o outro lado, o que se tem feito no país em relação às florestas plantadas.
O Brasil já é um dos maiores plantadores de florestas do mundo. Seja para atender à demanda da indústria de papel e celulose, seja para a simples recuperação de áreas degradadas, temos hoje 6,3 milhões de hectares plantados com florestas, e 100% da produção de papel e celulose vem desse setor: não se derruba uma só árvore nativa para isso.
Aliás, o Brasil é o quarto maior produtor mundial de celulose e o nono maior de papel, crescendo em ambos os segmentos graças à enorme competitividade, determinada exatamente pela plantação de florestas em nosso imenso território.
É interessante o fato de que, além de plantar quase toda essa área, o setor de celulose e papel mantém 2,9 milhões de hectares de florestas nativas para preservação, recuperação e estudos da biodiversidade.
Cerca de 2,7 milhões de hectares são certificados pelo FSC (Forest Stewardship Council) e pelo Programa Nacional de Certificação Florestal.
E os programas de parceria florestal desenvolvidos pelo segmento de papel e celulose têm um aspecto social relevante: são mais de 20 mil pequenas e médias propriedades rurais abrangidas, gerando 600 mil empregos diretos e indiretos. As florestas plantadas absorvem 1 bilhão de toneladas de CO2 da atmosfera por ano!
Vale a pena, enfim, revelar esse aspecto pouco conhecido da agricultura brasileira. Porque os demais setores são mais notórios, especialmente o dos grãos.
Nunca é demais repetir que nos últimos 20 anos a área plantada com grãos no Brasil cresceu 25%, e a produção, 157%, o que significa uma "economia" de 42 milhões de hectares de florestas ou cerrados.
Ou que a emissão de CO2 da cadeia produtiva de cana (cujo aumento de produtividade desde o início do Proálcool também preservou 5 milhões de hectares), é apenas 11% da emissão de CO2 da gasolina.
São dados importantes para o debate que se dará oportunamente na campanha para o segundo turno: é a sustentabilidade nas eleições.
ROBERTO RODRIGUES

ROBERTO RODRIGUES, 67, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp -Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.

Fonte: Jornal Folha de SP, 09/10



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